sábado, 21 de novembro de 2009

John Gray and the problem with Utopia

Mais um gajo com que estou em desacordo e com qual não partilho os pressupostos, uma vez que sou ateu, mas que apresenta um raciocínio que me parece mais inteligente do que as visões típicas do significado de no novo testamento haver o anúncio do paraíso. O simples facto de estar implícito na mensagem que esse paraíso não existe na Terra constitui uma visão bastante mais profunda (embora intuitiva) do que pode parecer à primeira vista sobre a realidade da natureza e o papel do homem nela (ou seja, quase nenhum).

O que este rapaz me parece esquecer é que não foi por acaso que o actual papa reafirmou que o inferno é um sítio real e material. Tal ideia força a que os católicos sintam a necessidade de se manter unidos para se precaverem dele. É mais uma tentativa desesperada de manter a coesão. Infelizmente para ele, muitos crentes, como alguns que conheço, afastam-se da igreja católica para poderem preservar a crença que essa mesma igreja católica lhes deu. Acho essa posição inteligente e uma boa estratégia para manter a sua coerência e fidelidade aos seus sentimentos.

Estas tácticas do vaticano acerca de várias ideias como a do inferno são, de facto, perigosas. Tal fuga do inferno e preocupação com condutas distrai-nos da outra mensagem de Cristo: "Olhai os lírios do campo..." distrai-nos da hipótese de conceber um paraíso que não existe nem no Céu nem na Terra mas que poderá ser sentido na Terra e vivido na mente de quem vê o Céu.

Para mim, lendo a Bíblia o que obtenho não é um código de conduta mas sim uma descrição quase exacta do que é a vida humana. Um Deus que parece gritar, outras vez sussurrar, outra vez dar, outras vezes tirar. Um constante Grande Outro Lacaniano que nos acompanha por mais que fujamos dele e que por vezes usamos para justificar a nossa violência ou criticar a dos outros. E pelo meio vão aparecendo aqueles que querem substituir aquilo a que eu chamo a "memória freudiana do pai tirano" por um projecto de irmandade daquilo a que chamo "filhos unidos que mataram o pai". A analogia de Freud é para mim, perfeita. A construção da sociedade será sempre um abafar da tirania da vontade de viver e de morrer, simultaneamante. O que vejo na Bíblia é uma soma de alucinações sangrentas e poéticas que no seu caminho para a suposta luz vão deixando mensagens (porventura, involuntárias) sobre a sua própria queda e impossibilidade. Uma espécie de solução infantil para a sensibilidade extrema que leva à intuição da tragédia. A bíblia é uma criança traumatizada que viu a vida como ela é.

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